Elio Gaspari, O Globo
Materializou-se um pesadelo do comissariado petista. Foi ao ar o grampo em que o empresário Fernando Cavendish, dono da empreiteira Delta, diz: "Se eu botar 30 milhões na mão de um político, eu sou convidado para coisa para c.... . Pode ter certeza disso, te garanto".
A versão impressa dessa conversa surgiu em maio passado, numa reportagem da revista "Veja". Ela descrevia uma briga de empresários, na qual dois deles, sócios da Sygma Engenharia, desentenderam-se com Cavendish e acusavam-no de ter contratado os serviços da JD Consultoria, do ex-ministro José Dirceu, para aproximar-se do poder petista. A conta foi de R$ 20 mil.
À época, o senador Demóstenes Torres, hoje documentadamente vinculado a Carlinhos Cachoeira, informou que proporia uma ação conjunta da oposição para ouvir os três empreiteiros. Deu em nada, como em nada deram inúmeras iniciativas semelhantes. Se houve o dedo de Cachoeira na denúncia dos empresários, não se sabe.
Diante do áudio, a Delta diz que tudo não passou de uma "bravata" de Cavendish. O doutor, contudo, mostrou que sabe se relacionar com o poder. Tem 22 mil funcionários e negócios com obras e serviços públicos em 23 Estados e na Capital. No Rio de Janeiro, participa do consórcio da reforma do Maracanã. Seu diretor regional de Goiás era interlocutor frequente de Carlinhos Cachoeira.
Na última eleição, Cavendish botou R$ 1,1 milhão no cofre do Comitê Nacional do PT e R$ 1,1 milhão no do PMDB. Em ambos os casos as doações foram legais.
Em apenas quinze meses, durante o segundo mandato de Sérgio Cabral, de quem Cavendish é amigo, a Delta conseguiu contratos no valor de R$ 1,49 bilhão, R$ 148 milhões sem licitações. Suas contas com o PAC chegam a R$ 3,6 bilhões.
Talvez o comissariado petista pensasse que o grampo de 2009 seria sepultado. Seu erro foi, e continua sendo, acreditar que pode empurrar esse tipo de conta para mais tarde.
Se o comissário Ruy Falcão acreditou que a CPI em torno das atividades de Carlinhos Cachoeira exporia a "farsa do mensalão" (rótulo criado por Lula), enganou-se. O PT tem um encontro marcado com as malfeitorias de seu comissariado.
Desde 2004, quando apareceu o primeiro grampo de Cachoeira, no qual ele corrompia um servidor que se tornaria subchefe da Casa Civil, a questão é simples: corta na carne ou continua a contaminar o organismo.
O que o comissariado vem fazendo é mostrar-se poderoso o suficiente para dobrar as apostas. Tamanha é sua onipotência que há nele quem creia ser possível contaminar ministros do Supremo Tribunal Federal.
Luiz Marinho, prefeito de São Bernardo e ex-ministro de Lula, condena a possibilidade de o ministro José Dias Toffoli vir a se declarar impedido de julgar o mensalão, mesmo tendo sido assessor do PT, da Casa Civil de José Dirceu e advogado-geral da União de Lula. Nas suas palavras: "Ele não tem esse direito." (O ministro Ricardo Lewandowsky, em cuja mesa está o processo do mensalão, pertence a uma próspera família de São Bernardo, em cuja Faculdade de Direito diplomou-se).
Passaram-se sete anos do surgimento da palavra "mensalão" e o PT continua adiando a hora da faxina. Na semana passada os comissários flertaram com a ideia da criação de uma CPI que supunham letal para a oposição. Em poucos dias, descobriram que estavam enganados.
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