28 março, 2007

ESTOU FICANDO RICO

Diogo Mainardi, VEJA 18/05/2005
Tem muito colunista da imprensa que ganha dinheiro proferindo palestras. Miriam Leitão lotou o auditório do Seminário Internacional de Suinocultura, em Angra dos Reis. Gilberto Dimenstein falou sobre qualidade de vida na Infocana, em Ribeirão Preto. Carlos Heitor Cony elogiou o livro do humorista Renato Aragão no Congresso Brasileiro dos Conselhos de Enfermagem, em Fortaleza. Arnaldo Jabor iluminou a platéia da Convenção Paranaense de Supermercados, no Expo Trade de Pinhais, na periferia de Curitiba.

Uma palestra rende aproximadamente 10 000 reais. Se o palestrante é muito requisitado, pode acabar ganhando mais dinheiro com palestras e seminários do que com seus comentários no jornal ou na televisão. Arnaldo Jabor é um exemplo disso. Ele já rodou o país todo com sua palestra "Projeto de um Brasil novo". Apresentou-a na Assembléia dos Dirigentes Lojistas de Cuiabá, no Congresso Paulista de Urologia, no Congresso Brasileiro de Otorrinolaringologia, no Encontro Árabe de Goiás, no café-da-manhã com clientes da Ticket Refeições e na reunião de alunos da Faculdade de Administração e Direito de Catanduva, realizada no Buffet Mazzi, com direito a hospedagem no Hotel Michelangelo, de São José do Rio Preto.

Eu não dou palestras. Não se trata de um problema moral. É uma questão puramente financeira. Pelas minhas contas, não vale a pena. O dinheiro não compensa. Se alguém me oferece 10 000 reais para dar uma palestra em Cuiabá, penso imediatamente que eu aceitaria pagar 15 000 reais para não ter de ir a Cuiabá. Fui um jovem muito ambicioso, sobretudo no campo literário. Minha maior ambição, hoje em dia, é jamais, em hipótese alguma, colocar os pés em Cuiabá. Eu também pagaria 15 000 reais para não jantar com os organizadores do Seminário Internacional de Suinocultura. Em vez de falar sobre suinocultura, um tema que certamente poderia me interessar, tenho certeza de que os comensais ficariam a noite inteira reclamando de Lula ou comentando os últimos lançamentos cinematográficos. Eu pagaria 15 000 reais, igualmente, para não ser fotografado numa feira agrícola de Ribeirão Preto apertando a mão de algum vereador ou deputado estadual que, com toda a probabilidade, deveria estar na cadeia. E pagaria outros 15 000 reais para não dormir no melhor hotel de Fortaleza, e comer no melhor restaurante de Fortaleza, e visitar a grande atração turística de Fortaleza, seja lá qual for. Já é duro agüentar o Brasil sem conhecê-lo. Imagine conhecendo-o.

Toda vez que me recuso a dar uma palestra, portanto, é como se economizasse 5 000 reais: a diferença entre o que me oferecem por palestra e o valor que eu tiraria do bolso, agora mesmo, para evitá-la. Já economizei mais de 200 000 reais desse jeito. Como sabem meus colegas colunistas, palestras são altamente rentáveis. Estou ficando rico graças a elas.

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