23 abril, 2012

Tô cansada!

Um Brinde à Ignorância, à Estultícia e à Estupidez!

"Tô cansada!"

Cansada de ver as mesmas coisas e ouvir as mesmas bobagens todos os dias. Cansada de ver o triunfo da ignorância e da superficialidade pelos quatro cantos da terra. Cansada de aturar a inversão dos valores e a deturpação das coisas, por aqueles  que tem mente fechada, rasa e fedida. E pensar que o ser humano se diferencia dos outros animais pela capacidade de raciocinar e melhorar o seu meio.

É triste ver gente se orgulhando da falta de educação e confundindo grosseria com personalidade forte. Boa parte das pessoas que assim se intitulam, usam esse rótulo para justificar sua total falta de controle, maturidade e principalmente senso de justiça. Então, somos obrigados a aturar os ataques daqueles que se consideram a criação mais importante da raça humana.

O homem tem o dom deturpar as coisas de acordo com o que lhe interessa e enxergar como lhe convém.  Desde quando uma personalidade é algo que rege a vida de alguém? Pois, o autocontrole é uma das características que mais evidenciam a qualidade do homo-sapiens, em diferenciação aos outros seres vivos. Somos seres dotados de inteligência e vontade, ou somos animais guiados exclusivamente pelo instinto?

Muito pior que animais, são aqueles que usam essa dita "inteligência", conscientemente para o mal. Pessoas com orgulho de si mesmas, como se "personalidade forte" fosse um troféu a ser exibido e aclamado e não uma mistura quase homogênea de arrogância, teimosia e uma forte dose de falta de educação. E pior, a ilusão de que as pessoas em volta devem que achar isso excelente e admirá-la, e sentir honrado por conviver com esse inferno. Crianças mimadas e pirracentas, adolescentes sem limites, adultos voluntariosos guiados pelo egoísmo, que alimentam suas ilusões imaturas e norteiam seus princípios. Teimosia vira convicção, arrogância vira sinceridade, medo vira respeito e falta de educação vira personalidade forte. Não há espaço para o outro, que se perde no vazio.

Shakespeare, disse que: "só há uma treva, a ignorância". E infelizmente, numa época de disseminação de informação e facilidade na busca de conhecimento, estamos cada vez mais próximos da estupidez e da estultícia. E quem quer ouvir a sabedoria e a razão? Quem quer ouvir a verdade e a justiça? Quem quer ouvir a voz da consciência entre o capricho de seus devaneios? Tais coisas servem sempre para os demais, pois a dor do exercício de olhar para dentro e enxergar o que de mais podre e vil em nós, causa cegueira e amnésia temporárias, porque quanto maior nossa consciência, mais evidente fica nosso fracasso.

Mais fácil é entreter-se.

Entreter-se com os inúmeros recursos audiovisuais que estão ao alcance das mãos, entreter-se com a vida alheia, entreter-se com o nada. Os heróis da atualidade não tem nada a dizer, porque não existem. Os espelhos são os artistas lindinhos e bonzinhos como Angélica e Luciano Hulk ou mesmos as sub-celebridades dos realitys. Não que eles sejam pessoas ruins, não podemos decretar sobre eles,  mas pobre daqueles que comem e  bebem deles e de tudo que a mídia televisiva tem defecado sobre a mente de uma legião de teleguiados.

Para que se envolver em assuntos chatos como política, corrupção, ética nas relações humanas e familiares, se o Crô não revelou quem era seu amante no último capítulo da novela Fina Estampa (que de "fina" não tem nada)? Por que saber sobre os conflitos no Oriente Médio, se os conflitos entre a "praia" e a "selva" foram tão excitantes? E a bela vitória dos bonzinhos deixou muitos "malvados" no twitter aborrecidos? Todos estão cansados de saber que existem fraudes em licitações, compra de privilégios, tramas e roubos em todas as esferas de poderes, mas ninguém quer pensar nisso. Pensar e se envolver contra isso. Porque a máxima de que "cada um deve fazer a sua parte", não se aplica em tempo algum!

Vamos lá, um brinde a ignorância, a estultícia e a estupidez! Felizes são, pois fim de novela e de reality show tem várias vezes ao ano.

Blog Entre Amigos, produzido por Aline Cleo Rodrigues
http://jblog.jb.com.br/entreamigos

18 abril, 2012

O encontro do PT com suas malfeitorias

Elio Gaspari, O Globo

Materializou-se um pesadelo do comissariado petista. Foi ao ar o grampo em que o empresário Fernando Cavendish, dono da empreiteira Delta, diz: "Se eu botar 30 milhões na mão de um político, eu sou convidado para coisa para c.... . Pode ter certeza disso, te garanto".

A versão impressa dessa conversa surgiu em maio passado, numa reportagem da revista "Veja". Ela descrevia uma briga de empresários, na qual dois deles, sócios da Sygma Engenharia, desentenderam-se com Cavendish e acusavam-no de ter contratado os serviços da JD Consultoria, do ex-ministro José Dirceu, para aproximar-se do poder petista. A conta foi de R$ 20 mil.

À época, o senador Demóstenes Torres, hoje documentadamente vinculado a Carlinhos Cachoeira, informou que proporia uma ação conjunta da oposição para ouvir os três empreiteiros. Deu em nada, como em nada deram inúmeras iniciativas semelhantes. Se houve o dedo de Cachoeira na denúncia dos empresários, não se sabe.

Diante do áudio, a Delta diz que tudo não passou de uma "bravata" de Cavendish. O doutor, contudo, mostrou que sabe se relacionar com o poder. Tem 22 mil funcionários e negócios com obras e serviços públicos em 23 Estados e na Capital. No Rio de Janeiro, participa do consórcio da reforma do Maracanã. Seu diretor regional de Goiás era interlocutor frequente de Carlinhos Cachoeira.

Na última eleição, Cavendish botou R$ 1,1 milhão no cofre do Comitê Nacional do PT e R$ 1,1 milhão no do PMDB. Em ambos os casos as doações foram legais.

Em apenas quinze meses, durante o segundo mandato de Sérgio Cabral, de quem Cavendish é amigo, a Delta conseguiu contratos no valor de R$ 1,49 bilhão, R$ 148 milhões sem licitações. Suas contas com o PAC chegam a R$ 3,6 bilhões.

Talvez o comissariado petista pensasse que o grampo de 2009 seria sepultado. Seu erro foi, e continua sendo, acreditar que pode empurrar esse tipo de conta para mais tarde.

Se o comissário Ruy Falcão acreditou que a CPI em torno das atividades de Carlinhos Cachoeira exporia a "farsa do mensalão" (rótulo criado por Lula), enganou-se. O PT tem um encontro marcado com as malfeitorias de seu comissariado.

Desde 2004, quando apareceu o primeiro grampo de Cachoeira, no qual ele corrompia um servidor que se tornaria subchefe da Casa Civil, a questão é simples: corta na carne ou continua a contaminar o organismo.

O que o comissariado vem fazendo é mostrar-se poderoso o suficiente para dobrar as apostas. Tamanha é sua onipotência que há nele quem creia ser possível contaminar ministros do Supremo Tribunal Federal.

Luiz Marinho, prefeito de São Bernardo e ex-ministro de Lula, condena a possibilidade de o ministro José Dias Toffoli vir a se declarar impedido de julgar o mensalão, mesmo tendo sido assessor do PT, da Casa Civil de José Dirceu e advogado-geral da União de Lula. Nas suas palavras: "Ele não tem esse direito." (O ministro Ricardo Lewandowsky, em cuja mesa está o processo do mensalão, pertence a uma próspera família de São Bernardo, em cuja Faculdade de Direito diplomou-se).

Passaram-se sete anos do surgimento da palavra "mensalão" e o PT continua adiando a hora da faxina. Na semana passada os comissários flertaram com a ideia da criação de uma CPI que supunham letal para a oposição. Em poucos dias, descobriram que estavam enganados.

15 abril, 2012

O Estado Brasileiro e a definição de anomia

Definição de anomia: estado de uma sociedade caracterizada pela desintegração das normas que regem a conduta dos homens e asseguram a ordem social. Anarquia. Ilegalidade.

Brasil: um dos países mais corruptos do mundo

Por: Leonardo Boff*

Corrupção: crime contra a sociedade

          Segundo a Transparência Internacional, o Brasil comparece como um dos países mais corruptos do mundo. Sobre 91 analisados, ocupa o 69º lugar. Aqui ela é histórica, foi naturalizada, vale dizer, considerada com um dado natural, é atacada só posteriormente quando já ocorreu e tiver atingido  muitos milhões de reais e goza de ampla impunidade. Os dados são estarrecedores: segundo a Fiesp (Federação das Indústrias de São Paulo) anualmente ela representa 84.5 bilhões de reais. Se esse montante fosse aplicado na saúde subiriam em 89% o número de leitos nos hospitais; se na educação, poder-se-iam abrir 16 milhões de novas vagas nas escolas; se na construção civil,  poder-se-iam construir 1,5 milhões de casas.

         Só estes dados denunciam a gravidade do crime contra a sociedade que a corrupção representa. Se vivessem na China muitos corruptos acabariam na forca por crime contra a economia popular. Todos os dias, mais e mais fatos são denunciados como agora com o contraventor Carlinhos Cachoeira que para garantir seus negócios infiltrou-se corrompendo gente do mundo político, policial e até governamental. Mas não adianta rir nem chorar. Importa compreender este perverso processo criminoso.

         Comecemos com a palavra corrupção. Ela tem origem na teologia. Antes de se falar em pecado original,  expressão que não consta na Bíblia mas foi criada por Santo Agostinho no ano 416 numa troca de cartas com São Jerônimo, a tradição cristã dizia que o ser humano vive numa situação de corrupção. Santo Agostinho explica a etimologia: corrupção é ter um coração (cor)  rompido (ruptus) e pervertido. Cita o Gênesis: "a tendência do coração é desviante desde a mais tenra  idade"(8,21). O filósofo Kant fazia a mesma constatação ao dizer:"somos um lenho torto do qual não se podem tirar tábuas retas". Em outras palavras: há uma força em nós que nos incita ao desvio que é a corrupção. Ela não é fatal. Pode ser controlada e superada, senão segue sua tendência.

         Como se explica a corrupção no Brasil? Identifico três razões básicas entre outras: a histórica, a política e a cultural.

         A histórica: somos herdeiros de uma perversa herança colonial e escravocrata que marcou nossos hábitos. A colonização e a escravatura são instituições objetivamente violentas e injustas. Então as pessoas para sobreviverem e guardarem a mínima liberdade eram levadas a corromper. Quer dizer: subornar, conseguir favores mediante trocas, peculato (favorecimento ilícito com dinheiro público) ou nepotismo. Essa prática deu  origem ao jeitinho brasileiro, uma forma de navegação dentro de uma sociedade desigual e injusta e à lei de Gerson que é tirar vantagem pessoal de tudo.

         A política: a base da corrupção política reside no patrimonialismo, na indigente democracia e no capitalismo sem regras. No patrimonialismo não se distingue a esfera pública da privada. As elites trataram a coisa pública como se fosse  sua e organizaram o Estado com estruturas e leis que servissem a seus interesses sem pensar no bem comum. Há um neopatrimonialismo na atual política que dá vantagens (concessões, médios de comunicação) a apaniguados políticos.

         Devemos dizer que o capitalismo aqui e no mundo é em sua lógica, corrupto, embora aceito socialmente. Ele simplesmente impõe a dominação do capital sobre o trabalho, criando riqueza com a exploração do trabalhador e com a devastação da natureza. Gera desigualdades sociais que, eticamente, são injustiças, o que origina permanentes conflitos  de classe. Por isso, o capitalismo é por natureza antidemocrático, pois  a democracia supõe uma igualdade básica dos cidadãos e direitos garantidos, aqui violados pela cultura capitalista. Se tomarmos tais valores como critérios, devemos dizer que nossa democracia é anêmica, beirando a farsa. Querendo ser representativa, na verdade, representa os interesses das elites dominantes e não os gerais da nação. Isso significa que não temos um Estado de direito consolidado e muito menos um Estado de bem-estar social. Esta situação configura uma corrupção  já estruturada e faz com que ações corruptas campeiem livre e impunemente.

         Cultura: A cultura dita regras socialmente reconhecidas. Roberto Pompeu de Toledo escreveu em 1994 na Revista Veja: "Hoje sabemos que a corrupção faz parte de nosso sistema de poder tanto quanto o arroz e o feijão de nossas refeições". Os corruptos são vistos como espertos e não como criminosos que de fato são. Via de regra podemos dizer:  quanto mais desigual e injusto é um Estado e ainda por cima centralizado e burocratizado como o nosso, mais se cria um caldo cultural que permite e tolera a corrupção.

         Especialmente nos portadores de poder se manifesta a tendência à corrupção. Bem dizia o católico  Lord Acton (1843-1902): "o poder  tem a tendência a se corromper e o absoluto poder corrompe absolutamente". E acrescentava:"meu dogma é a geral maldade dos homens portadores de autoridade; são os que mais se corrompem".

         Por que isso? Hobbes  no seu Leviatã (1651)  nos acena para uma resposta plausível: "assinalo, como tendência geral de todos os homens, um perpétuo e irrequieto desejo de poder e de mais poder que cessa apenas com a morte; a razão disso reside no fato de que não se pode garantir o poder senão buscando ainda mais poder". Lamentavelmente foi o que ocorreu com o PT. Levantou a bandeira da ética e das transformações sociais. Mas ao invés de se apoiar no poder da sociedade civil e dos movimentos e criar uma nova hegemonia, preferiu o caminho curto das alianças e dos acordos com o corrupto poder dominante. Garantiu a governabilidade  a preço de mercantilizar as relações políticas e abandonar a bandeira da ética. Um sonho de gerações foi frustrado. Oxalá  possa ainda ser resgatado.

         Como combater a corrupção? Pela transparência total, pelo aumento dos auditores confiáveis que atacam antecipadamente a corrupção. Como nos informa o World Economic Forum, a Dinamarca e a Holanda possuem 100 auditores por 100.000 habitantes; o Brasil apenas, 12.800 quando precisaríamos pelo menos de 160.000. E lutar para uma democracia menos desigual e injusta que a persistir assim será sempre corrupta e corruptora.

* Leonardo Boff é teólogo, filósofo e escritor